Direitos Animais
A expressão Direitos Animais diz respeito a um conjunto de princípios e normas que estabelecem os direitos fundamentais dos animais não humanos, reconhecendo-os como sujeitos de direitos, e não como objetos, independentemente de sua função ecológica, econômica ou científica. Esses direitos são fundamentados principalmente na senciência animal, que reconhece os animais como seres capazes de experimentar dor, prazer, e outras emoções, e na dignidade animal, que os valoriza como indivíduos com direitos intrínsecos.
O Decreto 11.349/2023 trouxe uma mudança significativa para a proteção dos direitos animais no Brasil quando criou a Secretaria Nacional de Biodiversidade, Florestas e Direitos Animais, bem como o Departamento de Proteção, Defesa e Direitos Animais dentro do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima. Com isso, o Direito Animal passou a ser reconhecido pelo Governo Federal. Essa nova estrutura tem o papel de criar políticas públicas, executar programas e promover a educação da sociedade sobre a proteção animal, consolidando o país como referência nesse tema.
Embora o Direito Animal compartilhe alguns princípios com o Direito Ambiental, como a proteção de espécies ameaçadas, ele se diferencia por tratar os animais como indivíduos com direitos intrínsecos, não apenas como parte de um ecossistema. Entre os princípios do Direito Animal estão a dignidade animal, a qual os atribui dignidade própria e valor intrínseco, sendo merecedores de respeito e tratamento ético, não sendo considerados bens ou coisas, a universalidade, que defende que todos os animais, independentemente da espécie, possuem direitos fundamentais; a primazia da liberdade natural, segundo o qual os animais têm o direito de viver em seus habitats naturais; a educação animalista, que trata do dever de promover a conscientização sobre a dignidade dos animais; a proibição do retrocesso, impedindo que legislações e decisões judiciais futuras reduzam a proteção já conquistada; e o princípio da precaução, o qual estabelece que na ausência de certeza científica sobre os efeitos potencialmente nocivos de uma ação ou política sobre os animais, deve-se adotar medidas preventivas para evitar possíveis danos a esses seres.
A Declaração Universal dos Direitos dos Animais (D.U.D.A.), de 1978, foi um marco importante no reconhecimento dos animais como seres dotados de direitos. Embora não tenha força legal, ela influenciou políticas públicas em diversos países e defende o direito dos animais a uma vida digna, sem maus-tratos ou exploração.
No Brasil, o artigo 225, § 1º, inciso VII, da Constituição Federal de 1988, estabelece que o Poder Público tem o dever de proteger a fauna e a flora, vedando práticas que coloquem em risco suas funções ecológicas, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais à crueldade. Esse dispositivo constitucional é a base para a proteção dos animais, reconhecendo a importância de um ambiente ecologicamente equilibrado, não apenas para a qualidade de vida humana, mas também para a preservação e o respeito aos seres vivos.
A Lei nº 9.605/1998, conhecida como Lei de Crimes Ambientais, é a principal legislação que trata das sanções penais e administrativas para atos lesivos ao meio ambiente, incluindo maus-tratos contra animais. O artigo 32 desta lei especifica que é crime praticar atos de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos, com penas que variam de detenção e multa, e que são agravadas em casos de morte do animal ou quando os crimes envolvem cães e gatos, conforme a Lei nº 14.064/2020 (Lei Sansão).
O Supremo Tribunal Federal (STF) tem reafirmado a proteção dos direitos dos animais em diversas decisões, fundamentadas no artigo 225 da Constituição Federal que veda práticas que submetam os animais à crueldade, com decisões que proíbem práticas cruéis como a vaquejada, brigas de galo e abate de animais apreendidos vítimas de maus-tratos, fortalecendo o reconhecimento de que os animais têm direitos que devem prevalecer sobre justificativas culturais.
Bem-estar Animal
Há uma relação intrínseca entre o bem-estar animal, a saúde ambiental e o desenvolvimento sustentável. O Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima trabalha para fomentar o desenvolvimento e a difusão de conhecimentos técnicos sobre o tema, com o objetivo de aprimorar as legislações nacionais em colaboração com outros órgãos do Governo Federal. Essa abordagem integrada busca harmonizar a proteção ambiental com a promoção do bem-estar animal, contribuindo para um desenvolvimento sustentável e equilibrado.
Para entender a definição de bem-estar animal, é preciso conhecer as Cinco Liberdades. O conceito surgiu em 1965 no Reino Unido, a partir do Relatório Brambell, elaborado em resposta a preocupações sobre o bem-estar dos animais de criação. O Comitê Brambell foi estabelecido para investigar as condições dos animais em sistemas de produção intensiva. O relatório resultante recomendou que os animais tivessem liberdade de se levantar, deitar-se, virar-se, limpar-se e esticar seus membros. Esses conceitos evoluíram para as Cinco Liberdades, amplamente adotadas globalmente como um padrão para o bem-estar animal. São elas:
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liberdade de fome e sede, garantindo acesso a água e alimentação adequada;
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liberdade de desconforto, com um ambiente apropriado e área de descanso;
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liberdade de dor, lesões e doenças, com prevenção e tratamento rápido;
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liberdade de expressar comportamentos naturais, proporcionando espaço e companhia adequada; e
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liberdade de medo e estresse, assegurando um ambiente que evite sofrimento mental.
Uma abordagem alternativa às Cinco Liberdades é o Modelo dos Cinco Domínios, desenvolvido na década de 1990 por David Mellor e Cam Reid, com o objetivo de fornecer uma visão mais detalhada e holística do bem-estar animal. Enquanto as Cinco Liberdades focavam principalmente na prevenção do sofrimento, o Modelo dos Cinco Domínios ampliou essa perspectiva, reconhecendo a importância dos estados emocionais positivos para o bem-estar geral dos animais. São eles:
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nutrição, que assegura alimentação e hidratação adequadas;
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ambiente, que garante condições confortáveis e seguras;
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saúde, focada na prevenção e tratamento de doenças e lesões;
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comportamento, que permite a expressão de comportamentos naturais; e
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estado mental, que considera como os outros domínios influenciam o bem-estar emocional do animal.
Animais na Ciência
A utilização de animais em ensino e pesquisa científica tem gerado crescentes preocupações éticas, especialmente pelo sofrimento causado a diversas espécies, como ratos, coelhos e cães. No Brasil, a Lei de Crimes Ambientais (Lei 9.605/1998) proíbe o uso cruel de animais em experimentos quando existem alternativas, prevendo penas de detenção e multa. Essa legislação busca proteger os animais de práticas desnecessárias, incentivando a busca por métodos que reduzam ou eliminem o sofrimento.
A Lei Arouca (Lei 11.794/2008) regulamenta o uso de animais em pesquisa científica no Brasil e criou o Conselho Nacional de Controle de Experimentação Animal (CONCEA), responsável por monitorar essas atividades. O Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima é membro do CONCEA, onde desempenha um papel fundamental na promoção de métodos alternativos, reforçando a proteção dos direitos animais e incentivando o uso de alternativas que minimizem o uso de animais.
Na União Europeia, a Diretiva 2010/63/UE também busca proteger os animais utilizados em pesquisa, aplicando o princípio dos 3Rs: Redução, Refinamento e Substituição. Essas diretrizes promovem a diminuição do uso de animais, a melhora das condições experimentais para reduzir o sofrimento e o desenvolvimento de alternativas que substituam o uso de animais. A transparência sobre o uso de animais é incentivada, promovendo uma abordagem ética em toda a região.
Os 3Rs é um princípio fundamental na ética da experimentação animal, com o objetivo de reduzir o número de animais usados, refinar as práticas para diminuir o sofrimento e substituir os animais por alternativas mais éticas e eficientes. Esses princípios orientam as práticas científicas modernas e sustentáveis.
O debate sobre o uso de animais em pesquisa tem crescido. Críticos apontam que métodos alternativos podem ser mais precisos, econômicos e éticos. Diferenças biológicas entre espécies e os custos elevados da experimentação animal têm impulsionado a adoção de tecnologias como simulações computacionais e culturas celulares, enquanto o mercado responde à crescente demanda por produtos “cruelty-free”, refletindo uma mudança nos padrões de consumo e pesquisa.
Maus-tratos a Animais
Maltratar animais é crime no Brasil, conforme a Lei nº 9.605/1998, a qual prevê sanções penais e administrativas, com penas que variam de três meses a um ano de detenção, além de multa. Para maus-tratos a cães e gatos, a Lei nº 14.064/2020 aumenta a pena para reclusão de dois a cinco anos. A Resolução CFMV nº 1236/2018 define crueldade, abuso e maus-tratos, destacando a responsabilidade de veterinários e zootecnistas em identificar e denunciar esses atos, e inclui orientações sobre práticas como eutanásia e transporte de animais, sempre visando minimizar o sofrimento.
A Teoria do Elo estabelece uma conexão entre a violência contra animais e contra humanos. Estudos mostram que pessoas que cometem crueldade contra animais têm maior probabilidade de praticar crimes violentos, como abuso infantil e violência doméstica. No Brasil, 71% dos agressores de animais também cometem crimes contra humanos. Este dado destaca a importância de combater a crueldade animal como uma estratégia de prevenção à violência mais ampla na sociedade. Ao denunciar maus-tratos não protegemos apenas os mais vulneráveis, mas também ajudamos a prevenir a violência contra humanos. Sua ação pode salvar vidas. Denuncie!
Saiba como denunciar
Caso você presencie maus-tratos a animais de qualquer espécie – sejam domésticos, domesticados, silvestres ou exóticos – como abandono, envenenamento, confinamento em correntes ou cordas curtas, manutenção em condições anti-higiênicas, mutilação, confinamento em espaço inadequado ao porte do animal, ausência de iluminação e ventilação, uso em shows que possam causar lesão, pânico ou estresse, agressão física, exposição a esforço excessivo (como tração de cargas por animais debilitados), participação em rinhas, entre outros – é essencial fazer a denúncia.
Dirija-se à delegacia de polícia mais próxima para registrar um Boletim de Ocorrência (BO) ou compareça à Promotoria de Justiça do Meio Ambiente, no Ministério Público. A denúncia de maus-tratos é respaldada pelo Art. 32 da Lei Federal nº 9.605/1998 (Lei de Crimes Ambientais), e pelo Art. 225 da Constituição Federal Brasileira, de 1988.
A autoridade policial tem a obrigação de receber a denúncia e registrar o boletim de ocorrência. Se o policial se recusar a agir, ele poderá ser responsabilizado por crime de prevaricação (Art. 319 do Código Penal). Neste caso, cabe denuncia ao Ministério Público ou à Corregedoria da Polícia Civil, com pena de detenção de três meses a um ano e multa.
Ao registrar a denúncia, descreva com precisão os fatos ocorridos, o local, e, se possível, o nome e endereço dos responsáveis. Se viável, apresente evidências como fotos, vídeos, notícias de jornais, mapas, laudos ou atestados veterinários, e o nome e endereço de testemunhas. Quanto mais detalhada a denúncia, mais eficaz será.
Denúncia no Ministério Público. O Ministério Público tem a autoridade para propor ação contra aqueles que desrespeitam a Lei de Crimes Ambientais. Portanto, é possível fazer a denúncia diretamente ao MP, o que pode acelerar o processo. Descreva os fatos ocorridos com exatidão, informe o local, e, se viável, o nome e endereço dos responsáveis. Apresente qualquer evidência disponível, como fotos, vídeos, notícias de jornais, mapas, nomes de testemunhas e seus endereços.
Denúncia ao IBAMA. O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), também pode ser acionado principalmente se tratando de animais selvagens, silvestres ou exóticos. As denúncias podem ser feitas pela Linha Verde.
Denúncia ao CONCEA. Caso se trate de maus-tratos em animais para pesquisa ou ensino, a denúncia pode ser direcionada à Comissão de Ética no Uso de Animais – CEUA/CONCEA, pelo Sistema de Ouvidorias do Poder Executivo Federal (e-OUV), direcionando a manifestação para o MCTIC – Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações.
Denúncia aos CRMVs: A lei se aplica a todos, incluindo médicos veterinários e zootecnistas, que devem responder tanto ética quanto penalmente por suas ações. Além de registrar a denúncia nos órgãos competentes, é necessário encaminhá-la ao Conselho Regional de Medicina Veterinária (CRMV) do estado onde a situação foi observada. O CRMV é responsável por investigar os fatos e fiscalizar o exercício legal da profissão. Se houver indícios de maus-tratos, o CRMV abrirá um processo ético-profissional. As penalidades previstas no artigo 33 da Lei nº 5.517/1968, incluem censura confidencial, censura pública ou suspensão do exercício profissional por até 90 dias.
O Conselho Federal de Medicina Veterinária (CFMV) é responsável por julgar os processos disciplinares em segunda e última instância, a partir dos recursos apresentados contra as decisões dos CRMVs. Esse julgamento é regido pela Resolução CFMV nº 1138/2016, que aprova o Código de Processo Ético-Profissional do Médico-Veterinário, e pela Resolução CFMV nº 1267/2019, que aprova o Código de Ética do Zootecnista.
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